Legislação permitiu mais flexibilidade nos registros, mas realidade pode mudar com novas medidas. Saiba o que é necessário para ter posse e porte de armas.
Nos últimos quatro anos, o número de armas registradas por caçadores, atiradores e colecionadores (CACs) aumentou consideravelmente, ultrapassando, em julho de 2022, a marca de 1 milhão.
Conforme dados do Instituto Igarapé, o acervo de armamentos registrados no Sistema Nacional de Armas da Polícia Federal (Sinarm/PF), em posse dos CACs no Brasil, subiu de 350.683 para 1.006.725 entre dezembro de 2018 e julho do ano passado, o equivalente a um aumento de 187%.
O crescimento, segundo informações da Agência Brasil, tem relação com medidas adotadas durante a gestão de Jair Bolsonaro na Presidência da República, que facilitaram o acesso a armamentos no país, principalmente entre os CACs. Entre as ações, estão a facilitação do porte municiado e a disponibilidade de armas mais potentes e em grande quantidade. Com isso, os membros de instituições militares deixaram de ser os principais proprietários de acervos particulares de armamentos no país, dando lugar aos CACs.
A diretora de pesquisa do Instituto Igarapé, Melina Risso, destaca que, além de terem mais armas, os CACs agora contam com um acervo mais potente e menos controlado. “O acesso às armas foi amplamente flexibilizado, mas não tivemos aumento na mesma intensidade do controle salvaguarda que tínhamos antes. Por exemplo, os atiradores tinham classes dentro da categoria. O acesso a outros tipos de armamento dependia da sua progressão no esporte. Nos últimos quatros anos, acabamos com essa progressão até para as armas de grosso calibre. O acervo deles tornou-se mais potente”.
Decreto 11.366/2023
Após anos de incremento nos números de registro e no mercado de armas nacional, a indicação é que a mudança de Governo vai esfriar esse ímpeto do setor. O Decreto 11.366, de 1º de janeiro de 2023, altera a política de controle de armas no Brasil e pode trazer muitos impactos para o mercado.
Saiba o que mudou com o Decreto 11.366/2023:
- Proibição de compra de munições para armas de uso restrito;
- Proibição para CACs (colecionadores, caçadores a atiradores esportivos) transportarem a arma carregada;
- Suspensão da concessão de novas licenças para clubes e escolas de tiro;
- Suspensão de novas licenças para CACs;
- Suspensão de renovação de registro de arma de uso restrito até a nova regulamentação sobre o tema;
- Criação de um grupo de trabalho para discutir as novas etapas da política de reformulação de armas.
Posse e porte de armas
A posse de armas é permitida para o cidadão comum no Brasil, mas é preciso seguir algumas regras para a comercialização e registro de armamento. Em contrapartida, o porte de armas é restrito aos profissionais de segurança pública, membros das Forças Armadas, policiais e agentes de segurança privada.
Posse de arma é a permissão para adquirir uma arma de fogo, enquanto o porte é a autorização para andar ou utilizar o armamento. Do ponto de vista legal, para possuir uma arma, atualmente, é necessário ser maior de 25 anos; realizar o exame psicológico; realizar a prova de prática com mínimo de aproveitamento de 60%; fazer a prova teórica com os conceitos de tiro esportivo, armas e regras de segurança com mínimo de aproveitamento de 60%; comprovante de residência; comprovante de ocupação e antecedentes criminais.
O gerente de projetos Bruno Lima, incentivado pelo avô, teve despertado, logo cedo, seu interesse em ter uma arma de fogo. “O começo da relação prática foi em uma instrução de tiro com uma pessoa certificada para ministrar o curso. Não é obrigatório, porém extremamente aconselhável que se faça esse curso, mesmo que básico, para saber as regras de segurança e manuseio de armamento”.
Posteriormente, veio o desejo de ter uma arma. “A posse de armas trouxe um hobby a mais. Desde que seja uma atividade controlada e não se faça uso indiscriminado de armas – as quais não são brinquedos – eu apoio o uso por civis”, conta.
Questionado sobre a sensação de segurança que o cidadão pode sentir ao ter uma arma, Lima revelou que não é bem assim. “Não vejo a posse como algo em que você estará mais seguro, uma vez que criminosos, caso queiram fazer algum mal, o farão. E, na maioria das vezes, possuem armamento melhor que o cidadão comum”, enfatiza.
No entanto, ele afirma que o porte de armas pode sim passar a sensação de segurança. “Quando está armado, você teoricamente está em pé de igualdade com algum outro indivíduo que queira praticar algum ato danoso contra a sua integridade física ou seu patrimônio. Mas o excesso de confiança pode causar dano também, uma vez que você estará mais propício a se defender e, consequentemente, vir a sofrer algum dano. Sensação de segurança sim, mas estar mais seguro não”, pondera Bruno.
O aumento de armas registradas, legais e para o civil com boas intenções é uma crescente que precisa ser encarada como algo seguro e pacífico. Do ponto de vista dos agentes de segurança, o uso de armas pode ser considerado benéfico.
Oldemar Filho é Guarda Civil Municipal de Contagem, Minas Gerais, e conta que teve acesso às armas de fogo quando foi para o Exército. “Em 1998, quando eu fui fazer o serviço militar obrigatório, eu tive contato com fuzil, pistola e armas mais pesadas”, lembra.
Ao sair do Exército, permaneceu com a posse, ou seja, sua arma permanecia em casa. Em 2003, quando entrou para a Guarda Municipal, a legislação não permitia o uso de armas para os agentes. Posteriormente, com mudanças na lei, em 2016, a força de segurança foi armada.
Filho é enfático ao dizer que o processo para adquirir a posse de armas exige muitos testes rigorosos. Dessa forma, “se a pessoa conseguiu comprar e ter a posse de armas é porque, de fato, ela tem condições de tê-la. Então, acho que é viável para sua segurança, proteção do seu bem e da sua família”.
No entanto, ele ressalta que o porte é ainda mais burocrático e perigoso, pois arma não é brinquedo. “Como agente público de segurança é diferente. Precisamos estar preparados, e utilizar a arma apenas caso seja necessário. E com a máxima segurança”.
“Vale ressaltar que a intenção nunca é matar e sim conter de forma necessária a ação de um agressor e, claro, proteger a si mesmo e quem estiver naquela cena”, explica o Guarda Civil.