As mulheres vão dominar o mundo. Isso é uma premissa para todos os setores. E por que não no mundo das armas e do tiro esportivo?
Nos dias atuais, muito se fala do papel da mulher na sociedade e de como ela vem conquistando espaços. No setor de tiro esportivo não é diferente. A representatividade feminina dentro dessa categoria vem crescendo e ganhando destaque.
Em 1968, as mulheres participaram pela primeira vez dos Jogos Olímpicos, na Cidade do México, na modalidade de Tiro Esportivo numa competição mista. As disputas femininas iniciaram um bom tempo depois, em 1984, em Los Angeles.
A primeira mulher na história a ganhar uma medalha olímpica nos Jogos Olímpicos de tiro esportivo foi a atleta norte-americana Margaret Thompson Murdock. Ela conquistou a medalha de prata, em 1976, e se tornou uma grande referência, contribuindo para a participação de outras mulheres na modalidade.
Atualmente, o tiro esportivo é disputado em 15 categorias, sendo nove masculinas e seis femininas. No Brasil, onde a modalidade engloba quatro confederações, a presença feminina está a cada dia mais comum, sendo impossível calcular o número de atletas.
Referência na área, Aline Kanyo é educadora física, instrutora de tiro, atleta, colecionadora de armas e grande incentivadora das mulheres dentro dessa prática. Com uma trajetória profissional de destaque, a especialista avalia a representatividade feminina como sendo de extrema importância, em especial, no tiro esportivo – modalidade ainda dominada por homens. Além disso, ela usa sua representatividade para divulgar o esporte e ampliar a inserção das mulheres dentro da modalidade.
“Acho superimportante a participação feminina no esporte e no tiro esportivo. Acredito que tem espaço para todo mundo, desde que se comprometa a fazer com responsabilidade um trabalho sério e que faça realmente por amor que o assunto merece. O potencial para as mulheres no segmento é enorme e ainda podemos crescer muito”.
Com muita dedicação à função de instrutora, Kanyo recorda que demorou a ministrar os primeiros cursos, pois queria se especializar para estar à frente de uma linha de tiro. “Alguns cursos, por exemplo, eu considero obrigatórios para ser um instrutor de tiro e um deles é o curso de APH – Atendimento Pré-Hospitalar”.
Após se sentir apta, iniciou sua carreira ministrando cursos principalmente para o público feminino. “As mulheres geralmente procuram por um curso de tiro porque passaram por algum tipo de trauma, ou por aquele tradicional medo cultural criado no sentido de que armas matam. Esses traumas e narrativas sempre tornaram os cursos femininos muito mais desafiadores e interessantes. Ver o resultado positivo ao final de cada curso sempre foi muito gratificante”.
Atualmente, em função de outros trabalhos, Aline já não ministra cursos, mas sempre está presente nas redes sociais ajudando outras mulheres, tirando as dúvidas e, quando está nos estandes, contribui com seu imenso conhecimento.
Incentivo
Após o trauma de sofrer quatro assaltos, em apenas três meses, dentro de casa e sozinha, Aline Kanyo foi em busca de mais segurança. “Parte dessa história é muito parecida com o que acontece, com muita frequência, com homens e mulheres, no Brasil. Foi assim que comecei a atirar e, logo, me apaixonei pelo tiro e também pelo colecionismo”, conta.
Nesse período, de acordo com a atiradora, era raro encontrar mulheres frequentando os estandes de tiro. Esse cenário a incomodou profundamente e fez com que ela se movimentasse para mudar essa realidade. “Então, logo pensei, vou ajudar a atrair mais mulheres e motivá-las. Comecei a postar um pouco mais da minha vida, dos meus treinos e da minha coleção nas redes sociais, foi um sucesso”.
Ainda sentindo que poderia contribuir mais, Kanyo se formou como instrutora com o objetivo de aprimorar os conhecimentos, adquirir novas experiência e trazer mais confiabilidade para as pessoas que a seguiam. “Nessa época, não existiam mulheres que postavam ou falavam do tiro nas redes sociais no Brasil. Sobre colecionismo, ainda sou a única, mas sobre outros conteúdos dentro do tema, o crescimento foi muito rápido”, recorda.
Como amante dos esportes, a prática de atirar contribuiu também para que Aline se tornasse uma atleta. “Assim, conheci várias modalidades até que apaixonei pelo tiro ao prato, ao qual me dedico até hoje”.
Atualmente, é embaixadora da maior feira do segmento no Brasil: a Shot Fair Brasil, ao lado de seu grande amigo e atleta olímpico Felipe Wu. Outra importante referência é a marca de armas que leva seu nome: a KANYO DEFENSE, fabricada nos Estados Unidos. Ela explica que “são carabinas produzidas pela conceituada marca americana WMD, customizadas especialmente com a minha curadoria para o Brasil através da importadora Wantek. A KANYO DEFENSE é a consolidação de um sonho. Fico muito feliz de poder trazer para o público brasileiro uma arma com tanta qualidade”, comemora.
Preconceito
Ao ser questionada se já enfrentou situações discriminatórias por ser mulher, Aline Kanyo afirma que não sofreu nenhum tipo de preconceito e que contou com ajuda e incentivo dos colegas de profissão. “Nunca escutei nenhum tipo de piada ou nem mesmo foram deselegantes comigo. Atribuo também isso à minha postura e à constante busca por conhecimento para melhoria da minha capacidade técnica”.
Dessa forma, ela revela que mais importante do que superar preconceitos é a mulher acreditar na sua própria capacidade. “No momento que acreditamos nisso e nos dedicamos, não existe preconceito que se sobreponha. Somos muito capazes, independente de gênero, e temos que demonstrar isso com atitudes”.
Considerado um grande benefício, no tiro esportivo, mais de 75% das habilidades estão relacionadas à concentração e à repetição de processos. “Nós mulheres somos muito boas nisso. Por isso, quando a mulher atira pela primeira vez, geralmente ela chega acertando tudo, se apaixona e não larga mais”, pondera Aline.
Futuro do esporte
Armas no Brasil sempre existiram. Conforme relata Aline Kanyo, independente do governo vigente, o esporte nunca foi tratado com a devida importância. “Nosso país ama o esporte e deseja estar armado por diversos motivos legítimos, o que demonstramos no referendo de 2005, no qual 63,94% da população votou pela manutenção do comércio de armas no Brasil”.
“Acredito que o tiro no Brasil sempre será um desafio, o mundo está vendo o que está acontecendo por aqui. A insegurança jurídica é gigante. Com a visão do atual governo, o segmento está parado, mas desejo que haja bom senso com urgência para que tudo retome a mínima normalidade”.
“Nossa primeira medalha nas Olimpíadas foi no tiro esportivo e temos capacidade e atletas para estarmos sempre entre os melhores do mundo. Este sonho deveria se tornar realidade”, conclui.