Aumento de IPI impacta mercado de armas e munições 

Recentemente, o Governo Federal alterou as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que incidem sobre armas de fogo, munições e artigos semelhantes. A medida faz parte do Decreto 11.764, publicado no Diário Oficial da União de 1º de novembro de 2023, e passará a ter efeito no primeiro trimestre de 2024.

Revólveres, pistolas, espingardas, carabinas, spray de pimenta e outros equipamentos passam a ter uma alíquota de 55%. Cartuchos e outras munições terão reajuste de 13% para 25%. O IPI incide sobre os produtos industrializados, e o valor costuma ser repassado ao consumidor no preço final das mercadorias.

A expectativa, segundo o Governo Federal, é que com as mudanças a arrecadação alcance R$ 1,1 bilhão em três anos, sendo: R$ 342 milhões em 2024; R$ 377 milhões em 2025; e R$ 414 milhões em 2026.

De acordo com nota emitida pela Presidência da República, “a medida se alinha com uma perspectiva conceitual de desarmamento da população civil, de recadastramento das armas em circulação e de combate à criminalidade. A política de recadastramento de armas permitidas e de uso restrito contabilizou em cinco meses 939 mil armas recadastradas pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, 99% do total”. 

No entanto, o setor se mostra completamente contrário a essa medida. Para o diretor da Performa Extreme Importação e Comércio de Armas, o empresário Marcus Vinícius, a situação é muito preocupante. “É alarmante perceber como essa decisão intensifica as dificuldades já enfrentadas pela categoria, considerando que a carga tributária sobre armas e produtos correlatos é uma das mais elevadas do país”, justifica.

Ele afirma ainda que, além das elevadas alíquotas federais, a carga tributária é exacerbada pelo ICMS imposto sobre armas, munições e correlatos, que varia significativamente entre os estados, chegando a extremos como 48% na Bahia. Essa disparidade regional contribui ainda mais para o encarecimento do produto final, tornando o acesso às armas cada vez mais restrito. 

“Essas medidas demonstram um grande descaso do Governo Federal com o setor de armas e munições, afetando tanto empresas e consumidores quanto trabalhadores do setor. E também restringem o direito de escolha dos consumidores, especialmente daqueles que buscam a posse de armas para proteção pessoal, mas que se veem cada vez mais limitados devido aos altos custos envolvidos”, completa Marcus. 

Também indignado com mais uma ação negativa para o setor, o diretor internacional de Vendas e Marketing da Springfield Armory, Luiz Horta (Tatai), afirma que os tributos aliados às restrições impostas anteriormente são assustadores. 

“Quando pensávamos que a nossa situação não poderia piorar, veio o novo IPI, dobrando a carga do produto quando importado, que já recebia uma dupla taxação, deixando-o extremamente caro. Agora, com o dobro de IPI, está ainda mais caro. Ou seja, essas restrições e modificações, além de praticamente ‘destruírem’ o setor, trouxeram mais insegurança jurídica, restringiram até mesmo o calibre .22LR quando em sistema semi-automático, e com uma taxação praticamente impraticável. A situação do setor é extremamente caótica e de difícil solução em curto prazo. O segmento está sendo destruído”, lamenta.

Segundo um levantamento realizado pela Associação Brasileira de Importadores de Armas e Materiais Bélicos (Abiamb), no mês de outubro, estima-se que as ações ocasionadas pelos decretos atuais já provocaram 43 mil demissões dos empregos diretos e indiretos, e os demais estão em risco. 

Marcus Vinícius acredita que o aumento dos impostos não só promete estrangular o mercado bélico, exacerbando as dificuldades já enfrentadas pelos empresários do setor, mas também tem implicações profundas para a segurança pessoal e para o esporte no país. 

“A decisão de aumentar o IPI sobre produtos bélicos afeta não apenas a indústria de armas e munições, mas também ressoa negativamente na segurança pessoal de cidadãos vulneráveis e na manutenção de práticas esportivas de grande valor histórico e cultural para o Brasil. É um cenário que exige uma reflexão urgente e a busca por soluções que equilibrem as necessidades econômicas do setor, a segurança pública e a preservação de práticas esportivas importantes”, explica o empresário.

“O que está ocorrendo no setor, desde outubro de 2022 até hoje, é a aplicação da fórmula ideal para extinguir de forma definitiva um segmento importante que já perdeu mais de 45 mil postos de empregos e pelo menos mil empresas fechadas. Somente as grandes empresas devem subsistir”, corrobora Tatai. 

Combate à criminalidade

Dentre outras justificativas, o Governo Federal classificou o aumento de impostos como uma ação de combate à criminalidade. Mais um ponto que o setor discorda.  

De acordo com relatório da Associação Brasileira de Importadores de Armas e Materiais Bélicos (Abiamb), um estudo publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), em 2022, analisou dados de 18 estados brasileiros e concluiu que o aumento da posse de armas de fogo por civis está associado a uma redução nos crimes violentos. O levantamento encontrou que, em estados com leis mais permissivas para a posse de armas de fogo, a taxa de homicídios é menor. 

Para Marcus Vinícius, a criminalidade é um problema enraizado em questões socioeconômicas profundas, que vão muito além da disponibilidade de armas de fogo legais. “Se realmente queremos analisar os impactos dessas medidas, basta olhar os números. Comparar os índices de Mortes Violentas Intencionais (MVI) com o aumento de armas registradas, munições comercializadas e Certificados de Registro (CR) emitidos nos últimos anos nos mostra uma realidade bem diferente daquela pintada pelo Governo”.

“Ah, então agora o combate à criminalidade passa por aumentar impostos sobre armas de fogo? Interessante! Quem diria que a solução para um dos problemas mais complexos e multifacetados da nossa sociedade poderia ser resolvida com uma simples canetada no IPI. Parece que estamos diante de uma nova revolução na política de segurança pública ou, mais provavelmente, de uma piada de mau gosto”, ironiza o diretor da Performa Extreme Importação.

O empresário ressalta, ainda, que as estatísticas sobre mortes de policiais servem para rebater o argumento do Governo Federal. Segundo ele, nos últimos quatro anos, houve uma redução drástica nesses números e, em 2023, foi registrado aumento alarmante. 

“É essa a receita de sucesso para o combate à criminalidade? Parece mais uma receita para o desastre. Chamar essa medida de ‘combate à criminalidade’ é, na melhor das hipóteses, um exercício de criatividade, e na pior, uma afronta à inteligência de todos nós que vivemos os desafios diários impostos pela violência. Estamos falando de vidas humanas, não de números em uma planilha de impostos. A verdadeira questão aqui é: quais são as verdadeiras intenções por trás dessas medidas e quem realmente se beneficia com elas? Porque, certamente, não parece ser a população que luta diariamente por segurança e justiça”, enfatiza. 

Para o diretor da Springfield, essa narrativa já foi desmistificada com a apresentação dos números exatos nas estatísticas de crimes e, com o recadastramento das armas dos CACs, em 2023, provando que suas armas não têm absolutamente nenhuma ligação com as armas do crime. “Durante o recadastramento feito pelo atual governo, mais de 99.6% das armas pertencentes aos CACs, foram recadastradas, ou seja, estão em mãos de pessoas de bem. Justamente para poder praticar o esporte, se defender, caçar ou colecionar”. 

“Fica claro, então, de forma muito sólida que as armas legais não têm nada a ver com as armas usadas no crime contra a polícia ou contra o cidadão. Os CACs são pessoas de bem e possuem o direito, como cidadãos brasileiros, a ter armas, isso a partir do referendo administrado no país em 2005, no qual mais de 68% da população votou a favor das armas. O povo brasileiro tem esse direito por lei e pela Constituição, o desejo do povo e da constituição deve ser preservado”, complementa Luiz Horta.

Soluções para a categoria 

Para estabelecer soluções, a categoria entende que é necessário esclarecer pontos do Decreto 11.615/2023, que trouxe muitas dúvidas e insegurança jurídica, deixando o mercado completamente perdido. 

“Frente a estes desafios, acredita-se que uma solução viável para o segmento é a aprovação de projetos legislativos como o PL 3723, que já passou pela Câmara dos Deputados e aguarda um relator na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) do Senado; e o apoio ao PDL 187/2023, em plenário na Câmara dos Deputados, que visa sustar os efeitos parciais do Decreto 11.615/2023. Essas ações legislativas podem corrigir as irregularidades e restabelecer um equilíbrio mais justo entre a regulamentação e a liberdade”, diz Marcus Vinícius. 

Tatai conta que praticava tiro esportivo, no mínimo, cinco vezes por semana e, em relação a um atirador de alta performance, “para ser competitivo, a minha manutenção era com 20 mil tiros mensais, podendo aumentar mais ainda em períodos das provas internacionais. Além disso, a munição de fábrica não alcança a necessidade de cada atirador, pois nossa munição é muito específica. Existem mais detalhes importantes neste decreto que deveriam ser ‘instrumentados’ para colocar em prática e causar um menor impacto no segmento, porque, como está agora, está tudo parado e com um IPI praticamente impraticável”.

Futuro

Otimista, Tatai acredita que 2024 será um ano melhor para o segmento. Entretanto, em relação ao IPI, será uma fase de aprendizado e manobras. “Vamos ter que aprender a absorver isso, diminuindo as margens, encontrando formas mais baratas de transportar, conseguindo baratear o produto na fonte, tentando conseguir negociações mais enxutas, enfim, enxugar os custos, desde o fornecedor de matéria-prima. Nosso objetivo é conseguir alcançar uma diminuição, ou melhor, otimização do preço das armas em pelo menos 10% para poder absorver um pouco o impacto do cliente final das armas”. 

Ele garante que a Springfield Armory já iniciou esse processo de otimizar os valores e, em breve, apresentará muitas novidades para a categoria. “Estabelecemos na nossa planta número 1 e 2 em Geneseo o ‘Lean Manufacturing System’, para melhorar a nossa produção nos Estados Unidos, melhorando os volumes e qualidade e diminuindo o preço desde o início do projeto das armas até o despacho para assim conseguir chegar de forma mais rápida, com qualidade premium e por um preço melhor ao cliente no Brasil e no mundo”, detalha. 

“Não vamos desanimar, mas sim seguir nossos planos para ‘reaprender’ e procurar novas oportunidades de implementar todos os nossos planos. Vamos defender o nosso legado desenvolvendo, produzindo e colocando à disposição do usuário a melhor e mais moderna tecnologia. Vamos disponibilizar a tecnologia de amanhã para hoje e a todos”, conclui Tatai.